terça-feira, 16 de junho de 2020

Apenas Sorria

Muitas pessoas conhecem “O Pequeno Príncipe”, um livro escrito por Antoine de Saint-Exupéry. É um livro fantástico e lendário, que funciona tanto como história infantil como fábula que leva os adultos à reflexão. Porém, poucos conhecem os outros escritos, novelas e contos de Saint-Exupéry.
Ele foi um piloto de guerra que lutou contra os nazistas e foi morto em combate. Antes da Segunda Guerra Mundial, lutou na guerra civil espanhola contra os fascistas. Escreveu uma história fascinante sobre essa experiência intitulada “O Sorriso”. É essa história que eu gostaria de compartilhar com vocês agora. Não de ficção. Prefiro acredi- tar na primeira hipótese. Segundo sua história, ele foi cap- turado pelo inimigo e lançado numa cela de prisão. Estava certo de que, pelos olhares desdenhosos e pelo tratamento rude que recebeu de seus carcereiros, seria executado no dia seguinte. A partir daqui, contarei a história conforme me lembro, com minhas próprias palavras.
“Eu tinha a certeza de que seria morto. Fiquei terrivelmente nervoso e perturbado. Remexi em meus bol- sos para ver se havia algum cigarro que tivesse escapado à sua revista. Encontrei um e, por causa de minhas mãos trêmulas, mal podia levá-lo aos lábios. Mas eu não tinha fósforos: estes eles haviam levado.
Olhei através das grades para meu carcereiro. Ele não respondeu ao meu olhar.
Afinal, não se estabelece contato visual com uma coisa, um cadáver. Eu gritei para ele: ‘Tem fogo, por favor?”. Ele olhou para mim, encolheu os ombros e veio até onde eu estava para acender meu cigarro. Ao se aproximar e acender o fósforo, seus olhos inadvertidamente se cruzaram com os meus.
Naquele momento eu sorri. Naquele instante foi como se uma faísca saltasse no espaço entre nossos dois corações, nossas duas almas. Sei que ele não queria, mas meu sorriso saltou por entre as grades e gerou um sorriso em seus lábios também. Ele acendeu meu cigarro, mas permane- ceu perto, olhando-me diretamente nos olhos e continuando a sorrir.
Continuei sorrindo para ele, agora consciente da pessoa e não apenas do carcereiro. E seu olhar para mim também parecia ter uma nova dimensão! —Você tem filhos? – ele perguntou.
—Sim, aqui, aqui. Tirei minha carteira e procurei nervosamente as fotografias de minha família. Ele também puxou as fotos de seus “niños” e começou a falar sobre seus planos para eles. Meus olhos se encheram de lágrimas. Eu disse que temia nunca mais ver minha família novamente, nunca ter a chance de vê-los crescer. Lágrimas também afloraram em seus olhos.
De repente, sem qualquer outra palavra, ele destravou minha cela e silenciosamente me conduziu para fora. Uma vez fora da prisão, conduziu-me silenciosamente por estradas secundárias, para fora da cidade. Lá, nos limites da cidade, ele me libertou, e sem nenhuma outra palavra, voltou em direção à cidade. ‘Minha vida foi salva por um sorriso’.”
Sim, o sorriso a conexão verdadeira, espontânea e natural entre as pessoas.
Conto esta história porque apren- di com ela. Realmente acredito que, se nós nos reconhecêssemos como pessoas, desconsiderando nossos títulos, cargos, status, não teríamos inimigos. Não poderíamos ter ódio, inveja ou medo. A história de Saint-Exupéry fala daquele mo- mento mágico em que duas almas se reconhecem.
Um sorriso genuíno dirigido a outra pessoa diz um bocado de coi- sas. Diz: “Eu o aceito como você é, de maneira incondicional”. Quando você sorri para uma outra pessoa, ela se sente valiosa, importante e digna. Sente-se melhor em relação asimesma.Eoquecustaavocêé um simples sorriso, uma expressão de autêntica cordialidade.
Vamos, sorria!
Daniel de Carvalho Luz

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